quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A ESTÓRIA DO MENINO CHAMADO CHICO



A Estória do Menino Chamado Chico

Francisco Cabral Bezerra, mais conhecido pelo apelido de Chico de Jacinto, é um moço quieto, tímido, educado e muito trabalhador. Não foi de estudar, mas nunca se negou a prestar um favor a parentes e amigos.
Mesmo sendo Católico Apostólico Romano, como seu pai e seus irmãos, Chico também gostava de ajudar a sua mãe durante os rituais de Candoblé. Ela era conhecida por Jovi e era Mãe de Santo de um terreiro de Umbanda ao lado de sua casa. Diferente dos seus irmãos, Chico a ajudava na limpeza do salão entre outros afazeres.
Quando algum dos tocadores de tambor faltava Chico era chamado para substituí-lo durante as realizações dos rituais. Ele gostava disso, pois ao final dessas cerimônias sempre algum dos participantes lhe dava uns trocados em gratidão pelo batuque.
Esse terreiro era formado por dois cômodos, um grande salão onde se realizavam os rituais e um pequeno quarto onde era guardado as obrigações da Mãe de Santo. Esse recinto é considerado um lugar sagrado para os Umbandistas e só poderiam entrar nele pessoas autorizadas pelos "Santos da Casa". Já o salão era um lugar bastante arejado, principalmente nas noites de calor, devido às amplas janelas e ausência de móveis no local.
Nas noites de muito calor, Chico costumava ir dormir ali, armando a sua rede e podendo se balançar à vontade. A sua mãe não reclamava, apenas dizia que nunca fosse dormir lá com bafo de cachaça e muito menos bêbado, porque os Santos não gostavam.
Numa certa noite de tempo quente e parado, sem uma brisa sequer e sem luar, Chico chega em casa por volta das 11 horas, depois de ter bebido umas e outras com uns amigos na rua. Resolve ir dormir no terreiro e pra lá leva sua rede, amarra nos caibros e se deita todo esquecido dos avisos de sua mãe. Logo pega num sono profundo.
Por volta da meia noite, Chico acorda com a rede balançando sozinha, pouco depois pedras e cacos de telha são jogados de dentro do quarto dos Santos, lá dentro uma barulheira danada, fazendo com que todos os seus cabelos ficassem de pé. Nessa hora, Chico dá um pinote mais rápido que um gato quando avista cachorro, desarma sua rede e sai correndo e ainda sendo alvejado por mais algumas pedradas.
Entrou em casa voando e foi dormir no chão do terraço de sua casa. E depois disso, nunca mais entrou no terreiro quando tomava umas cana.
Francisco Roberto Ferreira
Julho/2009.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

ZÉ MARIA

José Maria Ferreira de Araújo
Constava no antigo Dossiê como Edson Cabral Sardinha.
Militante da VANGUARDA POPULAR REVOLUCIONÁRIA (VPR).
Nascido a 6 de junho de 1941, no Ceará, filho de João Alexandre de Araújo e Maria da Conceição Ferreira Araújo.
Desaparecido desde 1970.
Foi condenado pela Justiça Militar a 5 anos e 1 mês de prisão pela 1ª Auditoria da Marinha, enquadrado na Lei de Segurança Nacional.
Preso no dia 23 de setembro de 1970 pelo DOI/CODI-SP, levado imediatamente às câmaras de tortura, morreu em consequência da violência das mesmas.
Vários presos políticos testemunharam as torturas e sua morte, podendo identificar como seus torturadores e assassinos: capitão Benone Arruda Albernaz, capitão da PM Tómas Paulino Rosa, investigador da Polícia Federal Maurício José de Freitas, delegado de polícia conhecido como "Dr. Raul", soldado da PM-SP conhecido como "Pedro DKW" e sargento da PM-SP Paulo Bordim.
O paradeiro do preso político José Maria Ferreira de Araújo foi descoberto nos arquivos do IML/SP, onde constava ter sido enterrado com o nome falso de Edson Cabral Sardinha na quadra 11, sepultura 119 do cemitério de Vila Formosa I.
No laudo necroscópico, o nome de Edson Cabral Sardinha é identificado por um "T" em vermelho (de Terrorista) para diferenciar dos demais corpos que por lá passavam. A solicitação do DOPS dá como histórico, que Edson havia morrido de "mal-súbito". O legista encarregado da perícia, Sergio Belmiro Acquesta, concluio que a morte era por causa "indeterminada", apesar dos vários exames feitos. As fotos do cadáver mostram claras marcas de torturas, que comprovam as denuncias de seus companheiros de prisão.
Casado com Soledad Barret Viedma, que foi morta em janeiro de 1973 em Pernambuco, junto com outros companheiros delatados pelo cabo Anselmo, agente infiltrado nas organizações de esquerda.
Em pesquisas do antigo DOPS/SP foi encontrado uma solicitação do Coronel Lima Rocha com o seguinte teor: "solicito remeter possível urgência foto, ficha datiloscópica, , exame necrológico e atestado de óbito do terrorista morto em set/70, conhecido (grifo nosso) como Edson Cabral Sardinha (Aribóia)".
Neste mesmo arquivo foram encontradas fichas de Edson Cabral Sardinha e José Maria Ferreira de Araújo, com o mesmo apelido de "Aribóia" e fotos, e que mostra que era possível verificar a verdadeira identidade do morto.
Quanto às circunstâncias em que se deu sua morte, também nos arquivos do DOPS/SP encontram-se documentos contraditórios como a resposta do Delegado do DOPS Alcides Cintra Bueno Filho ao Coronel Lima Rocha, chefe da 2ª Secção do II Exército, onde lê: "...falecido em consequência de violento tiroteio que travou com agentes dos órgãos de segurança", e a requisição do exame necroscópico, assinada pelo mesmo delegado em que diz: "tendo sido preso por atividades terroristas faleceu ao dar entrada na Delegacia Distrital presumindo-se mal súbito".
Coincidentemente a Delegacia Distrital onde de José Maria deu entrada é a da Rua Tutóia, ou seja, a OBAN.
Documentos datados de 7 de janeiro de 1971, também assinado pelo Delegado Alcides Cintra Bueno Filho e encontrado nos arquivos do DOPS/SP diz: "...não foi instaurado inquérito policial a respeito do óbito, dada a flagrante evidência da naturalidade do óbito. diante do exposto, determino o arquivamento do presente protocolado no Arquivo geral deste Departamento, para fins de prontuário".
O Relatório do Ministério do Exército diz que ele "utilizava-sedo nome falso Edson Cabral Sardinha. Existe registro de sua Certidão de óbito n° 31.153, livro 43-C-C-folha 124-V, expedida em 12 de julho de 1972, pelo Registro Civil do 9° Distrito Policial de Vila Mariana em São Paulo".
Encaminhou-se uma petição para o reconhecimento de sua identidade. Mas a sentença do juiz negou a petição por falta de corpo. Seus restos mortais não foram encontrados porque houve alteração da quadra onde ele foi enterrado.
De seu irmão, Paulo Maria Ferreira de Araújo:
"Meu irmão era marinheiro da Marinha do Brasil e servi no Rio de Janeiro desde 1959. O restante da família morava em Santa Luzia, na Paraíba. Mantinham contato com José Maria através de correspondências e, em fevereiro de 64, esteve em férias com a família. Nessa temporada José Maria colocou a família a par de sua participação junto a movimentos sindicalistas, levando inclusive consigo vários livros acerca de questões sociais. Ele pretendia, junto com outros marinheiros, criar uma instituição denominada Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil, no que eram apoiados pelo sindicado dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro. Esse tipo de Instituição era proibido pelas Leis da Marinha.
Assim que foi deflagrado o golpe militar de 1964, José Maria e outros companheiros foram presos por 'insubordinação', tendo ficado incomunicável na Ilha das Flores, durante 4 meses. Nossa família soube da sua prisão através da sua noiva, que morava no rio de Janeiro.
Num documento dos arquivos da Marinha, denominado 'Caderneta de Registro para Praça', consta a anotação de que, em 15 de abril de 1964, José Maria foi preso "por ordem do encarregado do inquérito policial militar para apurar a subversão na Marinha". Na mesma caderneta consta a anotação da expulsão de José Maria da Marinha em 8 de dezembro de 1964, tendo sido apresentado nesta data ao CAM - Centro de Armamento da Marinha. Durante esse período de prisão, nossa família recebeu uma carta que José Maria fez chegar às mãos de amigos, na qual pretendeu tranquilizar os familiares, nenhuma referência fazendo à prisão.
Tivemos conhecimento de que ele, por um período, teria trabalhado como metalúrgico na CBV - Companhia Brasileira de Vagões. A última carta que recebemos data de 6 de dezembro de 1966, que a família conserva até hoje. Nessa carta já assinada com seu 'codinome' Miguel, e confirma que não poderia fornecer seu endereço por não ter residência fixa. Afirmava que teria de passar alguns meses sem mandar notícias, não dizendo no entanto o motivo.
A partir daí, e durante um bom período, nossa família percebeu que suas correspondências estavam sendo violadas e, embora morassem numa cidade do interior, ouviam comentários acerca do fato de José Maria ser "terrorista". Passamos a viver sob muita tensão e medo.
Por volta de 1981, com o retorno ao país de alguns exilados, é que comecei a ter informações mais concretas a respeito da história do meu irmão. A primeira informação veio com um artigo assinado por Paulo conserva, no Jornal "A União", de João Pessoa, publicado em setembro de 1983. Paulo Conserva esteve exilado em Cuba, e nesse artigo faz referência a 'um paraibano de de Santa Luzia, José Maria, brutalmente torturado e assassinado entre dezenas de outros companheiros'. A notícia foi um choque para a família. Logo conseguimos um contato pessoal com Paulo Conserva, que prestou um depoimento de quase duas horas, no qual relatou que estivera com José Maria em Cuba, que este havia se casado com uma paraguaia e que tinha uma filha. Relatou ainda que recebera informações de companheiros que haviam chegado do Brasil em Cuba, que relatavam sobre a prisão de José Maria. Deu conhecimento ainda à família de queele usava os codinomes de 'Aribóia, ou Araribóia'. Relatou o trajeto de sua prisão.
FONTE: Grupo Tortura Nunca Mais - RJ.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A MATRIZ DE SANTA LUZIA NA MINHA VIDA

A Matriz de Santa Luzia na Minha Vida Antigo altar da Igreja de Santa Luzia




O que guardo "dela" desde a minha infância, a partir dos meus quatro anos de vida.

Um passado que já se foi, mas que ainda vive na nossa mente, precisa ser partilhado com os outros para que, na nossa humildade, nossa história não venha desaparecer conosco.

Daí porque, eu resolvi juntar essas notas esparsas e o que tenho na minha memória, num só caderno, desejando que alguém queira se dar o trabalho de lê-las e tire algum proveito. Pode até ser que a nossa Paróquia encontre nele algo de útil para colocar no seu livro de tombo.


Início Santa Luzia, 21/01/2002.




Capa


TUDO PARA JESUS, MARIA E JOSÉ



Teresa de Jesus Medeiros

Edição em fotocópia - Novembro de 2002